domingo, 10 de outubro de 2010

"Blog traduz uma prova de resistência."


Blog traduz uma prova de resistência. Um big brother ao avesso dos gêneros literários. Ao invés de ser conhecido, corresponde a um mergulho adoidado no anonimato. Distinto da noção do senso comum de que se trata de um lugar para aparecer. O resultado final (a possível badalação de um endereço virtual) não expõe a realidade. Os exibidos foram antes tímidos, os extrovertidos foram antes introvertidos. É a mais dolorida experiência editorial. O mais severo teste vocacional. Uma ferramenta do diabo, capaz de sugar sua vida ou sua aspiração.
Indica a fronteira entre o amador e o escritor, entre o diletante e o renitente, entre o curioso e quem não consegue se afastar da compulsão narrativa. O amador cansará nos primeiros meses. Vai deduzir que não vale a pena o trabalho, que ninguém lê. Uma tortura postar textos durante três meses e não receber nenhum comentário. Depois de postar, o autor perde a privacidade para se tornar – teoricamente – domínio público. Mas não saiu do caramujo do quarto, e entenderá que escrever e ser conhecido não acontece simultaneamente.
Escrever na rede é uma tentativa de suicídio, chamar atenção dos outros para a nossa carência. Um aviso escandaloso da nossa fragilidade. Pensando bem: publicar é um suicídio frustrado. Quando o ímpeto de sair da vida é usado para entender a própria vida e as dificuldades enfrentadas pelos demais autores.
Uma das virtudes do blog é justamente sua provação. Agüentar os contratempos no osso. Ver que não é um elogio que o fará continuar, muito menos uma crítica que o fará desistir.
Que nascer para a letra é amar a insuficiência. O escritor se sucede progressivamente. Melhora. Estar sozinho é ainda estar povoado. Povoado por dentro. Pelos personagens, pelas histórias familiares, pela observação aprofundada dos seus arredores. Só quem foi fantasma um dia poderá alimentar seus fantasmas.
Procura-se um reconhecimento externo e encontra-se algo mais preciso: a afirmação pessoal na persistência. Procura-se lá fora o que já se tinha
.
O esforço de sair da solidão ajuda curiosamente a fortalecê-la. Compreende que não escreve para completar um diário, ou para repetir sua história, se fosse assim não contaria com assunto para atualização semanal, mesmo que desfrutasse de uma trajetória acidentada e heróica como a de Hemingway.
Escreve para duvidar e se banhar na luminosidade da confusão biográfica. Acima de tudo, compreende que a imaginação não julga como a memória. Que imaginar é delicioso, imaginar: uma memória sem culpa.
Um texto postado é como um texto impresso. Mais fácil para localizar os erros, os tropeços, formar distanciamento. Confere uma maioridade na escrita, reforça uma postura profissional de jardinar e cuidar do verbo, de alterar a prosa e a poesia em nome da transparência e da fluidez. Há a formação gradual de uma assinatura, transmitindo uma visão de ser responsável por aquilo que se diz, de assumir honestamente as dívidas da boca. Organiza-se o rascunho, que é bem mais duro do que redigi-lo.
Não é fácil a rotina da blogosfera. Terá que superar vários fins, várias negativas, várias mortes. Superar a expectativa de fama pelo prazer do texto.
Por isso, o prazer necessita ser mais forte do que a dor. O masoquista é o que gosta mais do sofrimento do que da carícia. O blogueiro é o que esquece a ferida pela alegria.A diferença entre guardar o inédito no blog e na gaveta: o blog é uma gaveta aberta.


Fabrício Carpinejar

2 comentários:

  1. Belíssimo texto, com a lucidez de sempre do Carpinejar. Abç!

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  2. Fê... Fico triste por vc quanto ao primeiro Blog, espero sinceramente recuperá-lo, mas a vida é mesmo feita de RECOMEÇOS , e aqui tá de novo sua cara, tá lindo, e é só dar continuidade. Fui até o fim com a grande poetiza Cora Coralina, quase minha vizinha... é um encanto.
    Quanto a este post aqui, sabe que até hj fico tentando entender o que eu sou, às vezes me assusto com alguns comentários...tantos seguidores, e eu que comecei apenas pra jogar fora um saco de tristezas e lamurias que me causavam dor no estomago... e agora não tem nada que me dá prazer maior que estar aqui com cada um de vcs...
    Bjs e um forte abraço...

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